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Cientistas criam sorbet da palmeira juçara: sem lactose e de baixo valor calórico

Por Fleury Tavares  4 abril de 2016

 

O poderoso alimento funcional foi desenvolvido pela bióloga Júlia Fernanda Marinho  em sua pesquisa de mestrado no Departamento de Engenharia de Alimentos da Faculdade de Engenharia de Alimentos da USP, junto com pesquisadores própria FZEA/USP, em Pirassununga.

 

servletrecuperafoto SIMNo seu estudo, a jovem cientista (à esq.) desenvolveu e avaliou sorbets (como são conhecidos os sorvetes à base de água, com baixo valor calórico) e a sua principal motivação foi o fato de ser intolerante à lactose, pois trata-se de um alimento sem leite e lácteos (*).

“Entrei no mestrado querendo trabalhar com pesquisa e desenvolvimento de alimentos funcionais. Optamos pela juçara por ser uma palmeira ameaçada de extinção e a utilização dos seus frutos é uma maneira sustentável para que não desapareça” , explica.

Um aspecto importante na pesquisa  é que seus frutos podem ser encontrados facilmente, por tratar-se de um palmiteiro nativo da Mata Atlântica brasileira, do sul da Bahia até o norte do Rio Grande do Sul.

Além das propriedades benefícas do alimento, o sabor da juçara também é muito semelhante ao do açaí.

“A extração dos frutos permite que  a árvore seja preservada, enquanto a extração do palmito do seu monocaule (principal produto extrativista) leva ao sacrifício da planta e sua consequente extinção”, conta Júlia Marinho.

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Palmeira juçara encontrada em toda a Mata Atlântica. Foto: Martin Molz

Segundo ela,  a escolha  do palmiteiro juçara,  também levou em conta que há muitas comunidades ribeirinhas que utilizam a fruta como fonte de renda, ou seja a matéria prima pode vir de qualquer região que trabalhe com a planta.

Os sorbets atendem a demanda de toda a população com restrição ao consumo de leite, colesterol elevado, além de veganos

Benefícios: retardar envelhecimento e prevenir doenças

A bióloga salienta que o fruto da juçara é muito rico em compostos fenólicos, principalmente antocianinas, que são poderosos antioxidantes.

São capazes de impedir os efeitos danosos dos radicais livres no organismo – retardando o envelhecimento e prevenindo o surgimento de doenças como câncer, Alzheimere e cardiovasculares.

A união de compostos fenólicos (**), probióticos (***) e prebióticos em alimentos é um tema em expansão na área de tecnologia de alimentos e tem sido muito estudado pelos especialistas.

Além da soma dos benefícios individuais destes componentes.

Ou seja, os microrganismos probióticos auxiliam na absorção dos compostos fenólicos, os quais, beneficiam o crescimento destas bactérias no trato gastrointestinal, com efeitos benéficos na saúde.

“Os sorbets atendem a demanda de toda a população com restrição ao consumo de leite, como intolerantes à lactose, alérgicos à proteína do leite de vaca e veganos. Além de pessoas com restrição calórica ou com colesterol elevado”, conta Júlia.

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Sorbet da juçara tem poderosos antioxidantes.
Foto: Júlia Marinho

Provas científicas de benefícios à saúde

Os sorbets foram elaborados em cinco diferentes formulações e analisados com sucesso nos resultados das propriedades nutricionais, físico-químicas e testes de aceitabilidade sensorial.

Na primeira delas, considerada controle, a composição teve polpa de juçara, água, açúcar e emulsificante.

Na segunda formulação, além dos componentes da primeira, foi adicionado o probiótico Lactobacillus acidophilus.

Numa terceira formulação além dos itens da segunda, adicionou-se a fibra polidextrose (prébiótico) obtendo uma amostra “simbiótica”.

“Na quarta composição utilizei um outro tipo de probiótico, o ‘Lactobacillus paracasei’ e retirei a polidextrose”, conta Júlia.

A última composição foi semelhante à quarta, mas com a polidextrose adicionada. “A polidextrose é uma fibra industrializada muito usada na indústria alimentícia”, explica a pesquisadora.

Todas as formulações passaram por diversas análises durante os quatro meses em que estiveram armazenadas e não houve qualquer alteração no pH dos produtos e na manutenção das propriedades dos ingredientes.

“Nos quatro meses de armazenamento não houve nenhuma alteração do produto”, afirma, lembrando que, ao final conseguiu obter duas amostras probióticas e outras duas simbióticas.

Maior aceitação durante os testes de aceitação do sorbete Juçara foi a  dos produtos probióticos , importantes microrganismos para regulação intestinal, reduzir o colesterol e fortalecer a imunidade

 

Como foi criado  o sorbet funcional

Júlia Marinho conta que a polpa da juçara foi doada pela empresa catarinense Alicon, enquanto a calda foi preparada por ela usando o equipamento, liquidificados e ingredientes  cedidos pela sorveteria JR Cenzi, da cidade de Pirassununga/SP.

” Estamos pensando em patentear sorbet da juçara, pela repercussão e visibilidade dos benefícios cientificamente comprovados para a saúde humana,” diz. A jovem cientista ressalva, no entanto, que é  um produto de custo caro  por conter probióticos e prebióticos, ou seja um alimento muito diferenciado.

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Fruto tem sabor semelhante ao açaí e retarda o envelhecimento. Foto: Júlia Marinho

Análises sensoriais envolveram 100 provadores

“Além do sabor, foi levada em conta a intenção de compra, após os produtos serem provados. A maior aceitação foi em relação ao produto probiótico”, conta Júlia.

Os microrganismos probióticos são importantes para a regulação da microbiota (**) intestinal e têm diversos outros benefícios já comprovados, como diminuição do colesterol e fortalecimento da imunidade.

“Já os prebióticos são fibras alimentares capazes de potencializar a ação dos probióticos (***) no organismo de quem os consome e trazer também inúmeros benefícios”, afirma a bióloga.

A pesquisa de Júlia teve a orientação da professora Carmen Silvia Fávaro Trindade , do Departamento de Engenharia de Alimentos da FZEA/USP.

Os estudos tiveram início em 2014 e a dissertação Desenvolvimento e avaliaçãode sorbets probióticos e simbióticos elaborados com polpa de juçara (Euterpe edulis) acaba de ser apresentada na FZEA.

 

(*) A intolerância à lactose, também conhecida como deficiência de lactase, é a incapacidade que o corpo tem de digerir lactose – um tipo de açúcar encontrado no leite e em outros produtos lácteos

(**) Compostos fenólicos são estruturas químicas presentes em pequenas quantidades, em alimentos de origem vegetal, que podem exercer efeitos preventivos e/ou curativos em distúrbios fisiológicos no ser humano.

(***) Probióticos são definidos pelos órgãos competentes como microorganismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, conferem benefícios à saúde.

(****) Microbiota humana é a enorme quantidade de bactérias que vivem em harmonia no corpo humano auxilia a ação do sistema imune e a nutrição. Distúrbios nessa comunidade bacteriana, porém, podem causar doenças, como alergias e obesidade.

Mais informações: julia.marinho@usp.br