Bayer é criticada por vender no Brasil agrotóxicos proibidos na Europa

 

Do lado de fora do Centro de Conferências de Bonn, Alemanha, onde ocorreu reunião anual dos acionistas da Bayer, jovens protestaram contra a empresa. Foto: DW

 

Acompanhe nesta matéria do portal jornalístico Deutsche Welle (DW),  a manifestação de ativistas que criticam a companhia Bayer pela venda no Brasil de agrotóxicos proibidos na União Europeia.  O protesto aconteceu dia 26/4 em Bonn, Alemanha, durante o encontro anual de acionistas da companhia alemã. 

Veja também, o artigo da Campanha Permanente contra Agrotóxicos e Pela Vida, entidade que participou do movimento internacional, sobre esta questão e a crise instaurada na multinacional durante a primeira assembléia de acionistas  após a compra da Monsanto

 

Segundo a DW, a associação (Coordenação Contra os Perigos da Bayer e a Articulação de Acionistas Críticos), questiona multinacional alemã sobre aumento de 50% nos últimos três anos no número de pesticidas comercializados no Brasil e não permitidos na Europa e alerta para liberação de produtos pelo governo Bolsonaro.

Passado quase um ano da conclusão da aquisição da Monsanto pela Bayer, um grupo de associações e ativistas lançou no dia 25/4 o  estudo “Um ano Bayer-Monsanto: um balanço crítico”, questionando as práticas da multinacional alemã em diversas partes do mundo.

Das dez páginas do relatório, duas delas se referem ao Brasil, e o principal dado divulgado é que, de 2016 para 2019, houve um aumento de 50% no número de agrotóxicos vendidos no Brasil que são proibidos na União Europeia (UE). Um levantamento de 2016 apontou que eram oito produtos e, agora, três anos depois, são 12.

O estudo foi realizado em parceria pela rede de desenvolvimento alemã Inkota, a ONG católica de ajuda ao desenvolvimento Misereor e a rede de ativistas Associação de Acionistas Críticos na Alemanha.

“O Brasil é o mercado do futuro para os agrotóxicos. Os Estados Unidos já parecem ter atingido seu limite de liberações [de agrotóxicos], e a sociedade da União Europeia não está disposta a tolerar mais agrotóxicos. Países como China e Índia também já estão mais conscientes. No Brasil, porém, a sociedade em geral não parece fazer tanta pressão”, afirma Christian Russau, da direção da associação de acionistas críticos.

 

Em três anos, houve aumento de 50% de pesticidas comercializados no Brasil e que são proibidos na Europa

 

“E o Brasil ainda tem um governo de extrema direita despreocupado com o meio ambiente e uma bancada ruralista muito forte, que pressiona o governo para conseguir cada vez mais liberações”, diz.

O estudo sobre a Bayer foi lançado às vésperas da reunião anual de acionistas da multinacional, que ocorreu nesta sexta-feira (26/04) em Bonn, na Alemanha. O evento foi uma oportunidade para os ativistas apresentarem os dados compilados e questionarem a empresa sobre a venda no Brasil de agrotóxicos proibidos na Europa.

De acordo com a lei alemã, todos os acionistas têm direito de comparecer à reunião anual e fazer questionamentos, não importando o número de ações que detenham. Se o acionista não pode ou não deseja comparecer, é permitido que ele indique um representante.

A Associação de Acionistas Críticos mobiliza-se para comprar ações de várias empresas alemãs de capital aberto – como Bayer, BASF, Siemens e Deutsche Bank – e as gerencia para que ativistas possam participar das assembleias gerais e questionar as grandes corporações.

Desde 1986, a associação pressiona companhias por mais transparência, respeito aos direitos trabalhistas e humanos, fim da produção de armamento e proteção ambiental.

 

A velocidade de liberação dos agrotóxicos  causa preocupação. Para se ter uma ideia, somente nos primeiros 100 dias do governo já foram deferidos 152 novos produtos 

 

O brasileiro Alan Tygel, da coordenação da Campanha Permanente contra Agrotóxicos e Pela Vida, foi um dos ativistas que participou da reunião desta sexta-feira como representante da associação.

“As grandes corporações da área agrícola acabam focando países com regulações mais permissivas, como Brasil, Paraguai e Argentina. A Bayer é uma empresa privada que visa o lucro. Não esperamos que uma mudança parta dela, mas tentamos, sim, pressionar o governo para que se façam as regulações necessárias para que a saúde da população seja garantida”, afirma Tygel.

Para ele, em países como o Brasil as megacorporações em países têm maior poder de lobby com o governo, mais capacidade de investimento em propagandas e em pesquisas que as apoiem e a possibilidade de impor a venda de pacotes conjuntos de tecnologias – por exemplo, a comercialização de uma semente que exige o uso de um determinado agrotóxico vendido pela mesma empresa.

“No Brasil, com a união entre a Bayer e a Monsanto, mais de 50% das sementes transgênicas vêm da mesma empresa”, pontua.

 

Vestidos de apicultores, ativistas protestaram contra o alto consumo de agrotóxicos em frente ao evento da Bayer. Foto: Reuters/W.Rattay

 

Dados alarmantes do consumo de agrotóxicos

No relatório, os ativistas chamam a atenção para um dado alarmante divulgado pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) em 2015.

Naquele ano, estimou-se que cada pessoa no Brasil “consumiu” cerca de 7,3 litros de agrotóxicos por ano, ao dividir-se a quantidade de químicos vendida pelo número de habitantes do país.

O texto também destaca que um estudo da Universidade Federal de Mato Grosso mostrou que em 13 municípios (com população total de 644.746 moradores), onde soja, milho e algodão foram plantados entre 1992 e 2014, houve 1.442 casos de câncer gástrico, esofágico e pancreático.

Em comparação com outros 13 municípios (219.801 habitantes no total), onde a atividade principal é o turismo, e não a agricultura, o número de casos foi de apenas 53.

Com as últimas autorizações, nos primeiros 100 dias de governo, o ministério da Agricultura já deferiu o registro de 152 agrotóxicos.

Esses processos de autorização já tramitavam desde o ano passado. O governo de Jair Bolsonaro publicou, no entanto, o pedido de registro de outros 322 defensivos agrícolas, que passarão por avaliações.

 

Após a compra da Monsanto, a Bayer se tornou a líder mundial no mercado de sementes, fertilizantes e pesticidas, e o Brasil é o segundo maior mercado para a divisão agrícola da empresa.

 

velocidade de liberação de agrotóxicos no Brasil é outro destaque do estudo, que aponta que, somente nos primeiros 42 primeiros dias do governo de Jair Bolsonaro foram liberados 57 novos registros.

Atlas desenvolvido pela professora Larissa Bombardi, compara nível de tolerância de resíduos aceitos no Brasil e Europa. Foto: Cecilia Bastos/Jornal da USP

Outra preocupação dos ativistas é quanto aos níveis de tolerância de resíduos, que são muito maiores no Brasil do que na União Europeia.

Num estudo separado, o atlas Geografia do Uso de Agrotóxico no Brasil e Conexões com a União Europeia, publicado no final de 2017, a professora de Geografia da Universidade de São Paulo (USP) Larissa Bombardi comparou os dois cenários.

Segundo a pesquisadora, a  atrazina, por exemplo, sétimo pesticida mais vendido no Brasil e proibido na Europa, tem um limite máximo de resíduo para cana, milho e sorgo cinco vezes maior no Brasil do que o permitido na UE.

Além disso, no Brasil, o limite de resíduo de glifosato no café é dez vezes maior do que na UE e, na soja, 200 vezes maior. Quanto à água potável a diferença de parâmetros é ainda maior: o limite de glifosato permitido é 5 mil vezes maior no Brasil.

 

Mesmo preocupados com a venda e uso de agrotóxicos, muitos europeus não percebem que acabam consumindo  agrotóxicos proibidos de forma indireta, como por exemplo na soja que alimenta o gado

 

Consumo indireto 

Mesmo preocupados com a venda e uso de agrotóxicos na União Europeia, muitos europeus não percebem que acabam entrando em contato com essas substâncias indiretamente.

O Atlas da Geografia aponta que o Brasil exportou, em 2016, café equivalente a 974 milhões de dólares para a Alemanha. No Brasil, para o cultivo de café estão autorizados 121 tipos de agrotóxicos, dos quais 30 são proibidos na Europa, ou seja, 25%.

“Muitos alemães não sabem que, indiretamente, eles consomem esses agrotóxicos proibidos aqui. Por exemplo, na soja que serve de comida para o gado, que depois vai parar na mesa das pessoas”, ressalta Lena Michelsen, consultora global de alimentação e agricultura da Inkota.

O que diz a companhia

Em resposta a críticas de ativistas e organizações, incluindo o estudo da Inkota, Misereor e da Associação dos Acionistas Críticos, a Bayer afirma que comercializa mundo afora, “inclusive em economias emergentes e em países em desenvolvimento”, apenas produtos fitofarmacêuticos que estão registrados em pelo menos um país da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Além disso, a empresa diz que os produtos da empresa no Brasil e em todos os países onde atua atendem aos requisitos regulatórios de cada governo.

“No Brasil, por exemplo, comercializamos o indaziflam, um dos nossos mais novos herbicidas. Não solicitamos aprovação para esta substância na União Europeia, porque os produtos à base de indaziflam são comercializados exclusivamente na Ásia e na América Latina”, afirma a Bayer.

A empresa também informa que todos os produtos fitossanitários comercializados pela Bayer em todo o mundo “foram cuidadosamente testados quanto à segurança para os seres humanos, animais e ambiente e que foram aprovados pelas autoridades reguladoras competentes”.

Sobre o poder de influência sobre governos, a corporação afirma que “o trabalho político da Bayer é regido pelos princípios da transparência e do Código de Conduta para o Lobby Responsável” da empresa.

Confira a matéria original aqui.

 

 

Enquanto movimentos sociais criticam a Bayer pelos perigos que seus produtos – agrotóxicos, sementes transgênicas e remédios – possam causar, os grandes acionistas estão preocupados com a queda nas ações devido aos processos contra a Monsanto nos EUA, agora herdados pela empresa. Foto: Divulgação

 

“Crise na maior transnacional do agronegócio”

Confira trecho do artigo da Campanha Permanente contra Agrotóxicos e Pela Vida relatando as dificuldades que a  Bayer enfrenta com pesadas críticas após compra da Monsanto e que,  33,6% dos acionistas da companhia chegaram a votar pela demissão da diretoria.

 

A primeira assembleia de acionistas da gigante alemã Bayer após a compra da Monsanto teve um resultado histórico no mundo corporativo europeu. 55,5% dos acionistas votaram pela demissão da diretoria da empresa, incluindo o atual CEO Werner Baumann, e 33,6% votaram pela demissão do conselho de administração.

Números desta grandeza atingem pela primeira vez uma empresa listada na bolsa de valores alemã. Em geral, os votos pela demissão não passam de 1%.

Os motivos dos votos contrários, no entanto, são diversos. Enquanto movimentos sociais criticam a empresa pelos perigos causados por seus produtos – agrotóxicos, sementes transgênicas e remédios – os grandes acionistas estão preocupados com a queda nas ações devido aos processos contra a Monsanto nos EUA, agora herdados pela Bayer.

Em 2018, o valor total das ações teve queda de 38%, e a empresa foi rebaixada pela S&P para o grau BBB, o último nível antes de ser considerada uma ação-lixo.

Assim como todos os anos, a Coordenação Contra os Perigos da Bayer e a Articulação de Acionistas Críticos, em conjunto com diversos movimentos organizou um protesto em frente ao centro de convenções onde a assembleia de acionistas foi realizada, na cidade de Bonn, na Alemanha.

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