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Quanto mais integral for o alimento, melhor!

Foto: Revista Idec

 

Diário Verde repercute resultado de levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) de que, para a maioria dos consumidores, apenas alimentos com mais de 50% de cereais integrais devem ser classificados como tal no rótulo, publicado originalmente na Revista Idec.  Acompanhe. 

 

A oferta de alimentos integrais vem aumentando nos últimos anos. Facilmente, encontramos no supermercado uma variedade enorme de produtos desse tipo, desde macarrão até biscoitos recheados. Contudo, esse crescimento trouxe à tona a pergunta: o que um produto precisa conter para ser chamado de integral?

Uma pesquisa de opinião online realizada pelo Idec em novembro de 2016 constatou que, para 85,5% dos participantes, um produto só deveria utilizar o termo “integral” no rótulo se possuir, no mínimo, 50% de cereais integrais em sua composição.

Desses consumidores, 48,6% consideram aceitável que o produto contenha entre 50% e 90% desse tipo de ingrediente; já 36,9% acreditam que 100% dos cereais deveriam ser integrais. A pesquisa obteve 944 respostas de internautas de todo o Brasil.

Muito diferente do que esperam os consumidores, hoje, no Brasil, não existem regras claras para um produto ser declarado integral. Com isso, alimentos que contêm quantidades pouco significativas ou nem apresentam cereal integral entre os seus componentes utilizam esse termo livremente.

A boa notícia é que, desde junho do ano passado (2015), a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) vem se movimentando para criar uma nova regulamentação para esses alimentos. Considerando que novas regras devem surgir em breve, o objetivo da pesquisa foi saber a opinião dos maiores interessados no assunto: os consumidores.

Veja, a seguir, os principais pontos em discussão.

Biscoito integral: parece mas não é!

A iniciativa da Anvisa de regulamentar o assunto resultou de uma pesquisa realizada pelo Idec com biscoitos integrais, publicada em março de 2016 na REVISTA DO IDEC (edição no 205) e repercutida no Diário Verde. O levantamento revelou que a ausência de critérios, em muitos casos, confunde o consumidor.

Apenas 3 de 14 biscoitos avaliados continham farinha de trigo integral ou cereal como principal ingrediente; seis deles tinham mais farinha refinada do que integral e cinco nem continham farinha ou cereais integrais em sua fórmula.

Para obter essa informação, hoje é preciso consultar a lista de ingredientes, que apresenta a composição do alimento em ordem decrescente: o primeiro da lista é o que está presente em maior quantidade, e o último, em menor. Mas muita gente desconhece essa regra.

“Entre o público leigo, pouquíssimas pessoas leem a lista de ingredientes para saber se o alimento é integral ou não. A maioria acredita no que está escrito no rótulo”, afirma Mariana Garcia, nutricionista do Idec.

Farinha de trigo reconstituída: mistura da refinada e farelo de trigo, mas não é alimento integral

Embora a lista de ingredientes seja uma fonte de informação importante, ela é limitada – não dá para saber a quantidade exata de cereais integrais, apenas se tem mais ou menos do que refinados (alguns fabricantes informam o percentual na lista, mas não são obrigados). Além disso, a lista também pode confundir.

Hoje, muitos fabricantes utilizam farinha de trigo reconstituída na formulação de produtos integrais. Contudo, 67,2% dos participantes da pesquisa afirmaram não saber o que significa esse termo; entre os que o conheciam, só 25,4% acertaram sua definição.

Foto: Linkedin

Segundo o Idec, preocupa ainda mais a confusão que esse termo causa ao se considerar que parte significativa das pessoas que respondeu ao questionário é profissional da área da saúde (23,7%) e possui nível elevado de escolaridade (37,7% são pós-graduados).

A farinha de trigo reconstituída é formada pela mistura de farinha refinada e farelo de trigo, um dos constituintes separados do trigo integral durante o processo de refino. As indústrias do setor alegam que o uso desse ingrediente mantém a composição “integral” do produto, pois adiciona fibras a ele.

Mas a nutricionista do Idec  Mariana Garcia (ao lado) esclarece que não é bem assim. “O farelo de trigo tem mais fibras, mas o grãointegral não é só isso, ele tem outros nutrientes que se perdem no processo de refino”, explica.

 

“Ao utilizar esse tipo de ingrediente em vez do grão integral, a indústria poderia alegar no rótulo que o produto contém mais fibras, mas não chamar esses alimentos de integrais”, defende.

Durante a pesquisa, após a definição de farinha de trigo reconstituída ser apresentada, 92,7% dos participantes da pesquisa consideraram que produtos formulados com esses ingredientes não podem ser chamados de integrais.

 

Os desafios para melhorar os alimentos integrais: ausência de padrões mínimos e resistência da indústria

 

Ainda não há critérios mínimos definidos pela Anvisa para a nova regulação de alimentos integrais. Segundo a agência, a ideia é adotar uma metodologia clara, com padrões quantitativos e qualitativos que facilitem a comparação entre produtos, garantam o acesso à informação pelos consumidores e estimulem as empresas do setor a investir em alimentos à base de cereais integrais com melhor qualidade.

A Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia) diz concordar com a necessidade de uma nova regulamentação sobre alimentos integrais, a fim de criar um padrão nacional, e que já propôs à Anvisa a discussão de aspectos relevantes, como composição e aracterísticas dos alimentos, processos produtivos, abordagens globais e monitoramento.

Contudo, nas reuniões iniciais realizadas pela agência para discutir o tema, das quais o Idec participou, a indústria vem demonstrando resistência às novas regras, pois teriam de modificar seus produtos para serem chamados de integrais. Os argumentos são diversos: aumento do custo de produção, impacto no prazo de validade e na oferta, mudança no sabor e queda nas vendas.

Segundo a nutricionista do Idec, no entanto, esses argumentos não devem ser empecilhos para a adoção de regras que garantam uma informação precisa ao consumidor.

“Se for exigido no mínimo 50% de cereais integrais, por exemplo, com certeza mudará a textura e o sabor de produtos que hoje se dizem integrais, mas sequer têm esses ingredientes na fórmula”, aponta Garcia. “Porém, a indústria poderia manter a formulação de seus produtos, só não poderia mais chamá-los de integral”, completa.

Integrais pelo mundo

Diversos países, como Alemanha, Canadá, Chile e África do Sul, têm regras claras para alimentos integrais. De acordo com a Anvisa, ainda não é possível apontar se a nova norma brasileira será baseada em algum modelo internacional, pois é preciso que as regras sejam efetivas para resolver os problemas verificados no mercado nacional.

“A maioria dos países possui uma definição de farinha integral, com convergência no entendimento de que esse produto deve conter os principais constituintes naturais do grão intacto em proporções inalteradas. Entretanto, quando se considera os produtos à base de cereais integrais, observa-se uma menor harmonização de critérios”, diz a agência.

Para o Idec, a nova regulamentação deve adotar regras simples e diretas. “O importante é que haja critérios para que um produto possa ser chamado de integral, e, assim, o uso desse termo no rótulo possa cumprir o que está no Código de Defesa do Consumidor: fornecer informação clara e precisa”, conclui a nutricionista do Instituto.

 

LÁ FORA É ASSIM

Veja exemplos de critérios mínimos para um produto ser declarado integral em outros países:

Austrália, Reino Unido e Canadá: 8g de grãos integrais por porção.

Estados Unidos: 8g de grãos integrais por porção ou grãos integrais como 1o ingrediente da lista.

Holanda: 50% de grãos integrais.

Alemanha: 90% dos grãos integrais para pães e 100% para macarrão.

Mais informações: Idec